terça-feira, 22 de abril de 2014

Claúdia Ferreira da Silva [1]




Meu nome é Claúdia Ferreira da Silva, como tantas Silvas e Ferreiras desse país. Tenho 38 anos e alguns amigos me chamam de Cacau. Em uma manhã contei as moedas que tinha e fui rapidamente comprar pão pros meus filhos e sobrinhos, porque o tempo ruge e ainda tinha que ir trabalhar. Vi uma movimentação estranha, não sabia o que estava acontecendo tudo que vi foi um cano de revolver apontado para mim e logo uma dor nas costas e no pescoço. Cai. A última coisa que pensei é que meus filhos e sobrinhos não teriam café da manhã naquele dia.
Ainda respirava, mas não conseguia me mexer, só pensava em meus filhos e sobrinhos, tinha medo, tinha a certeza que morreria e não sabia o que seria deles. O que será de mim? Fui jogada no camburão como um saco de lixo depois fui arrastada no asfalto como uma flor que se despetala. Esfolada. Baleada. Sem corpo e sem vida. Meu crime? Ser negra, ser pobre, ser mãe, ser mulher!! Talvez ninguém se lembre de mim, nem dos meus filhos e sobrinhos, talvez eu seja mais uma nas estatísticas dos assassinatos acidentais promovidos pela policia. Talvez eu seja apenas mais uma Silva em um cemitério sem lápides. [2]

QUE NÃO HAJAM MAIS CLAUDIAS [3]
(Lilian Sankofa)

Um corpo estendido
Uma vida que vai
Mais uma criança que chora
Mais uma mãe que se vai
A revolta no peito
Do descaso eu lamento
Quando eu deito no leito
A cabeça que gira, vira, grita
NÃÃÃÃOOOOOOOOO
Pra vida que foi
Da mulher que trabalha
Que é pobre e é preta
Arrastada na rua
Como saco de lixo
Pelos porcos eu grito
DESGRAÇADOS MALDITOS!
Que guerra injusta 
Uns com paus
Outros com armas
Reverter o processo
Vigiar nossas vidas
Cuidar dos filhos e filhas
Pra vencermos à luta
E que não hajam mais Claudias

[1] Claúdia da Silva Ferreira foi baleada e jogada no camburão de uma viatura da policia militar ainda viva no dia 17 de março de 2014, a mesma caiu e ficou presa ao carro e foi arrastada por cerca de 250 metros, apesar dos gritos das pessoas avisando sobre o que ocorria os policiais não deram atenção e não pararam. Foram julgados e absolvidos porque alegaram não ter visto a mesma sendo arrastada. Quantos pobres pretos estão presos há anos nas delegacias sem se quer ter comprovação de seus “crimes”. Claúdia morreu e foi mais uma a ir para as estatísticas dos crimes “acidentais” do estado. Nos links abaixo há o vídeo que foi filmado dela sendo arrastada e uma postagem do Blogueiras feministas também sobre o caso:

Vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=lsALsX84HIA
Postagem Blogueiras Feministas: http://blogueirasfeministas.com/2014/03/claudia-silva-ferreira-38-anos-auxiliar-de-limpeza-morta-arrastada-por-carro-da-pm/

[2] Texto usado na peça “do Luto à Luta” do Coletivo de gênero Violeta Parra e colaboradores no dia 12 de abril de 2014 no Espaço Cultural Mané Garrincha, a mesma foi apresentada junto a outros textos de mulheres torturadas na ditadura. Na peça fizemos a relação entre a ditadura militar e os resquícios que até hoje permeiam a nossa sociedade, como a morte absurda de Claúdia e a absolvição simples que foi feita aos seus assassinos.


[3] Esse poema foi feito por Lilian do coletivo de Rap Sankofa no qual a mesma, que milita pela questão da mulher negra, demonstra sua indignação sobre o ocorrido.

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